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A mostrar mensagens de julho, 2020

e se eu partir?

e se eu partir? e se eu partir agora? Se eu partir agora como se parte em viagem e como partia assim de repente sozinha sem avisar a gente... já que não posso ir... posso ainda e tenho a liberdade de partir eu já senti que podia ter partido ocasião que desgostei... mas agora... agora já nem sei... e se partir? podias dormir meu amor dormir de noite como o hibisco e se partir? Lúcia Cunha

cardo

meu pequeno cardo de flor laranja oxalá te pudesse levar pelos recantos do meu jardim tudo deve ser em ti de bom fundo nada que me preste ainda admiração terei que saber beber dos teus espinhos flores gotas de orvalho ah se soubesses como são mais espinhoso meus pés das calçadas que me ferem não venhas por aqui meu bom cardo meu pequenino pezinho de boa vontade procura estepes áridas são mais doces que este caminho Lúcia Cunha

Fluxível

Lamento se não for isso que procuro. Lamento. Brando ,  frouxo ,  flácido                           fluxível perdemos algures a paixão nos nossos olhos lembraste quando foi? meu amor morre-me as garças no ninho                             e eu choro porque me parece tudo tão Brando ,  frouxo ,  flácido                           fluxível onde corre a égua de crina negra? ah vazio Brando ,  frouxo ,  flácido                           fluxível! tão brando! tão fouxo! TÃO FLÁCIO! onde anda o meu teso povo teso onde anda a Fala? A tua Fala vigorosa?! onde anda? Brando ,  frouxo ,  flácido                  ...

seca

o verão secou-me no corpo como o trigo seco só e morto avistei porém em qualquer sítio muito além vislumbres de alguém, nada mais que fogo fátuo seca a terra levanta cinza pó acre e cal agarram-se a mim secos tojos cujos picos nas carnes já não fazem mal quem quando me levou a voz ensurdeci-me e não me lembro muito doce me assemelha e pareça quase aragem, é só bafo podre afável mofeta misericordioso ardor nos brônquios me consome até aos alvéolos derradeiro fulgor de vida que me queima que arde que me mata a mata só cinza acre Lúcia Cunha

As meninas podem cortar-se com as facas

As meninas não precisam de cavaleiros precisam de espadas  eu desbravei o caminho a sabre e depois? não é assim com toda a gente? As meninas não precisam de príncipes de heróis... precisamos de boas montadas feridas saradas sermos luas e os próprios Sóis. Lúcia

Saiu em voo a ave da noite

Saiu em voo a ave da noite ouvi seu pio a ave precisa de chorar e voltar a voar chora ave, chora tudo de uma vez, outra vez a vida é feita de ciclos de choro, coro... não há nada que se possa excluir não vale a pena ocultar que há dias em que a ave precisa... piar chora, de uma vez chora tudo o que tenhas hoje para chorar tu sabes que não é para a vida toda mas se tem que ser que o faças para depois voar  e um dia que tudo me volte a ter sabor como me sabem as palavras e a música Lúcia

palavras fechadas

E se tiveres que seguir em frente e feliz? há tanta coisa que eu já não sei como é talvez seja apenas uma coisa tonta da meninice os reflexos da luz num charco todas as palavras tão pensadas deixaram-me presa apesar de segura qualquer voo passou a ser repensado e até os versos deixaram de ser fluidos e quentes por serem tão ponderados confiar dói e a desilusão destrói deixei há muito de cantar o choro e achava-me leve e segura e achava-me viva, madura trilhei caminhos de pé com os meus pés tudo em volta fala e eu escuto a sinestesia era perfeita como se de nada mais carecesse não, eu sabia que qualquer palavra era escutada, dissecada examinada deixei de dar cor às palavras não dei música às minhas telas nunca mais te chamaria... e se te chamo que te oiça o vento e te diga quem sou como passam as brisas no tempo e se fecham as palavras como a ave que um dia voou. L.C.

Procurei um céu na manhã que nasci.

Procurei um céu na manhã que nasci. Procurei ser eu e senti-me leve. Mas tu és como um daqueles muros onde se embate. Sentir hostilidade é como colocar-me num deserto. Por muito que cresça e viva haverá este não sei o quê de naïf que não me deixa entender o desagrado com que alguém se me dirige, uma vez que eu só vim em paz. Ser grande não significa pisar... deixa-me sempre algo sem energias, letárgica, vazia.~